O shutdown do governo dos Estados Unidos entrou, nesta quarta-feira (5/11), em seu 36º dia consecutivo, tornando-se oficialmente a maior paralisação da história americana. O impasse entre o presidente Donald Trump e o Congresso já afeta milhões de cidadãos, paralisa programas federais e ameaça o ritmo da economia da maior potência do mundo.
Sem avanço nas negociações, republicanos e democratas seguem trocando acusações. A disputa, centrada no orçamento e em questões ligadas ao sistema de saúde e benefícios sociais, expôs mais uma vez o profundo bloqueio político em Washington.
“As vítimas da paralisação dos democratas estão começando a se acumular. A questão é por quanto tempo os democratas vão continuar com isso. Mais um mês? Dois? Três?”, provocou o líder republicano no Senado, John Thune.
Do outro lado, o líder democrata Chuck Schumer reagiu com ironia: “Enquanto Donald Trump está se gabando da reforma dos banheiros da Casa Branca, os norte-americanos estão em pânico sobre como pagar o plano de saúde no próximo ano.”
Ao Metrópoles, o jornalista e observador da Casa Branca Fernando Hessel avaliou o recorde do shutdown.
“É impressionante como a crise se arrasta sem que governo e oposição mostrem vontade real de resolver. O foco virou o jogo político, não o impacto na vida do cidadão”, afirmou.
Segundo ele, “o que está em jogo é a continuidade da assistência de saúde, o cuidado com o povo americano. A população não está em segundo plano, está em último”.
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Linha do tempo da crise
- A paralisação começou em 1º de outubro, após o Congresso falhar em aprovar o orçamento federal. No dia seguinte, a Casa Branca iniciou cortes de pessoal em diversas agências governamentais.
- Em 10 de outubro, Donald Trump declarou pretender “demitir muitos” servidores que, segundo ele, estariam alinhados ao Partido Democrata.
- Mesmo após uma decisão judicial suspender novas demissões, o governo manteve o plano de enxugamento e indicou que os desligamentos poderiam chegar a 10 mil funcionários caso o impasse persistisse.
- O atual shutdown já supera as paralisações de 1995 e 2013, e agora ultrapassa a de 2018-2019, tornando-se a mais longa da história norte-americana, com 36 dias de duração
Mais de 1 milhão de funcionários sem salário
Com a paralisação já ultrapassando o recorde anterior — também sob o governo Trump —, mais de um milhão de servidores federais continuam sem receber. Parte deles é obrigada a comparecer ao trabalho, enquanto outros foram colocados em licença não remunerada, sem qualquer previsão de retorno.
Embora uma lei determine o pagamento retroativo após o fim do shutdown, o governo norte-americano ainda não confirmou se aplicará a regra nesta nova crise. Os trabalhadores terceirizados, como faxineiros de museus e motoristas contratados, não têm sequer essa garantia.
Fome e insegurança alimentar aumentam
A assistência alimentar, que atende cerca de 42 milhões de americanos, foi drasticamente reduzida. O fundo emergencial do Programa de Assistência Nutricional Suplementar (SNAP) cobre somente parte dos US$ 8 bilhões mensais necessários.
Nessa terça-feira, o republicano ameaçou reter ajuda alimentar essencial até o fim do shutdown, mesmo após a administração ter afirmado a um tribunal que continuaria financiando benefícios parciais.
“Os benefícios do SNAP, que aumentaram em bilhões e bilhões de dólares (muitas vezes!) durante o desastroso mandato do corrupto Joe Biden […] só serão concedidos quando os democratas da esquerda radical reabrirem o governo, o que eles podem fazer facilmente, e não antes!”, disse Trump.
Logo em seguida, a secretária de imprensa da Casa Branca, Karoline Leavitt, afirmou que o governo manterá o plano de financiar parte da ajuda alimentar durante a paralisação. “O governo está cumprindo integralmente a ordem judicial”, disse.
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Shutdown bate recorde
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Presidente Donald Trump no Air Force One
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O presidente dos EUA, Donald Trump, discursa com altos líderes militares na Base do Corpo de Fuzileiros Navais de Quantico
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Presidente dos Estados Unidos, Donald Trump
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Educação, saúde e economia em colapso
Os programas de educação infantil Head Start começaram a perder financiamento no início de novembro. Segundo a CNN, 140 programas em 41 estados já estão sem recursos.
Na saúde, os Centros de Serviços de Medicare e Medicaid (CMS) tiveram de convocar funcionários de volta para garantir o período de inscrição. Enquanto isso, o país enfrenta uma falha de vigilância sanitária: relatórios sobre gripe, Covid-19 e vírus respiratórios estão suspensos desde o início da paralisação.
A situação nos aeroportos se deteriora. Com controladores de tráfego aéreo trabalhando sem salário, aumentaram as faltas por doença e as demissões. Desde o início do shutdown, mais de 400 atrasos foram registrados em grandes aeroportos do país.
O Escritório de Orçamento do Congresso (CBO) estima um prejuízo mínimo de US$ 7 bilhões à economia apenas no primeiro mês, podendo chegar a US$ 14 bilhões. Além disso, o governo federal já atrasou US$ 33 bilhões em gastos públicos, valor que pode alcançar US$ 74 bilhões se o bloqueio se estender por mais duas semanas.
Ironias, memes…e recorde de shutdown
Ao longo de todo o impasse, a Casa Branca e os republicanos optaram por uma estratégia de confronto e ironia, em vez de negociação. Em meio à paralisação, o governo Trump chegou a lançar uma página “paródia” dentro do próprio domínio oficial, chamada “MySafeSpace — a place for dems”, transformando a crise orçamentária em sátira política.
O site imitava o antigo layout do MySpace, com trilha de mariachi, referências a líderes democratas e provocações às pautas progressistas, como diversidade e imigração. Em um dos trechos, a página zombava dos democratas com a frase: “Amamos DEI, transgêneros para todos e benefícios para imigrantes ilegais. Não nos importamos se nossos homens em uniforme recebem salário.”