Os maiores bancos privados do país começaram a adotar uma postura mais cautelosa na hora de desembolsar empréstimos para consumidores e empresas com receio do crescimento da inadimplência, em meio ao maior nível de juros registrado em quase 20 anos, disseram executivos do Itaú Unibanco, Bradesco e Santander.
Durante a divulgação dos seus balanços do terceiro trimestre, eles disseram que por ora a inadimplência está sob controle, mas que o momento requer cuidado ao emprestar para consumidores de maior risco de crédito. O surgimento de novas recuperações judiciais de empresas também está no radar dos executivos.
“Estamos cautelosos para não fazer nenhum tipo de aventura, linhas que têm maior risco não queremos”, afirmou o CEO do Bradesco, Marcelo Noronha, durante teleconferência com investidores.
A avaliação é que a taxa básica de juros (Selic) em dois dígitos desde fevereiro de 2022 tem penalizado a saúde financeira de indivíduos e companhias.
Dados do Banco Central mostram que a alta em 12 meses no estoque de crédito vem se reduzindo, passando de um pico de 12,3% em fevereiro a 10,1% em setembro. A taxa básica de juros, que nesta quarta-feira (5) foi mantida em 15% ao ano, sobe desde setembro do ano passado, e a expectativa de analistas ouvidos pelo BC é de queda a partir de janeiro do ano que vem.
Esse movimento se reflete no balanço dos bancos, disse João Daronco, chefe de ações da Suno. “Há sinais de desaceleração na carteira de crédito, e isso é natural em um cenário em que os juros subiram tão intensamente. Existe um momento de acomodação dos bancos, de entenderem qual será o seu real nível de perdas para que haja o provisionamento adequado.”
No caso do Bradesco, a carteira de crédito expandida avançou 9,6% no terceiro trimestre ante mesmo período do ano passado, abaixo da alta anual verificada no segundo trimestre, de 11,7%.
O crédito pessoal, que havia crescido 17,5% no segundo trimestre (sempre na comparação anual), passou a subir 10,3% no terceiro. E a carteira do cartão de crédito subiu 9,3%, puxada principalmente pela alta renda, com alta de 38,3%; no caso da baixa renda, houve queda de 4%. A inadimplência total se manteve em 4,1%.
A perda de fôlego pode ser observada também no Itaú Unibanco, onde a carteira de crédito, que havia subido 7,3% no ano no segundo trimestre, reduziu o ritmo de alta a 6,4% no terceiro trimestre.
O foco hoje, indicou o CEO do Itaú, Milton Maluhy Filho, é nos clientes de renda mais alta. “Há clientes onde continuamos crescendo, e clientes onde desaceleramos o ritmo por entender que são menos resilientes em ciclos mais longos (de juros altos)”, disse durante entrevista à imprensa nesta quarta-feira.
A inadimplência do banco se manteve em 1,9% —para pessoas físicas, foi de 3,6%, e para pessoas jurídicas, de 0,11%. Apesar do baixo percentual no calote das empresas, Maluhy apontou que há indicadores que sugerem que uma parte das empresas enfrenta dificuldades.
“Vemos isso nas recuperações judiciais, no dia a dia da atividade das empresas. É um nível de incerteza maior para os próximos anos,” afirmou.
O Santander foi o único caso, entre os três bancos privados, em que a carteira de crédito ampliada no acumulado de doze meses avançou mais no terceiro trimestre do que no segundo: a alta de 3,8% na comparação anual foi puxada pelo crédito a empresas. A inadimplência aumentou, com as contas em atraso a mais de 90 dias indo de 3,1% em junho para 3,4% em setembro.
Para o vice-presidente financeiro do Santander, Gustavo Alejo Viviani, o banco olha com atenção a situação das pequenas empresas. “Elas enfrentam um pouco mais de pressão, com recuperações judiciais”, disse ele a jornalistas na semana passada. A instituição tem sido também mais cautelosa na hora de aceitar renegociar empréstimos vencidos.
Na avaliação de Eduardo Rosman, analista do BTG Pactual, os dados dos bancos mostram desaceleração do crédito, mas em um nível menor do que o previsto pelas instituições financeiras há alguns meses.
“Isso porque a economia tem performado melhor há alguns anos. Neste ano, não tem sido diferente, com a baixa taxa de desemprego”, afirmou. Para ele, novas linhas de crédito, como o consignado privado também ajudam na expansão das carteiras.
Para Eduardo Nishio, analista chefe de ações da Genial, a tendência é que o crédito continue a desaceleração nos próximos meses, e tudo dependerá do cenário eleitoral e do que vai acontecer com a Selic. A expectativa dos participantes do mercado é que a taxa encerre 2026 em 12,25%, de acordo com o relatório Focus do BC.
“Ano que vem será um ano volátil, com risco fiscal, e os bancos não gostam de volatilidade. Por outro lado, a Selic estará caindo, e isso ajuda os bancos a controlarem melhor a inadimplência.”