A Câmara dos Deputados aprovou nesta quarta-feira (5) um projeto que endurece as regras para desapropriação de propriedades rurais destinadas à reforma agrária. O texto, que segue para o Senado, limita o mecanismo apenas a imóveis considerados improdutivos e altera a forma de avaliação do cumprimento da chamada função social da propriedade.
O projeto de lei 4.357/2023, de autoria dos deputados Rodolfo Nogueira (PL-MS) e Zucco (PL-RS), foi aprovado com substitutivo do relator, Pedro Lupion (PP-PR). A proposta modifica a lei 8.629/1993, que regulamenta a reforma agrária e a função social da terra, e recebeu 265 votos favoráveis e 33 contrários.
Pela Constituição, a propriedade produtiva está protegida contra desapropriação desde que cumpra sua função social. O conceito refere-se ao aproveitamento racional da propriedade, respeito às normas ambientais e trabalhistas e promoção do bem-estar de quem nela vive e trabalha.
O projeto, no entanto, determina que uma fazenda só poderá ser desapropriada se descumprir todos esses requisitos simultaneamente. Além disso, a desapropriação se restringirá a propriedades improdutivas, embora a Constituição não faça essa distinção.
A proposta também altera critérios ligados ao meio ambiente. O texto prevê que a função social só será considerada descumprida se houver decisão judicial definitiva condenando o proprietário por crime ambiental, com sanção de desapropriação.
Hoje, a lei considera o equilíbrio ecológico e a saúde das comunidades vizinhas como parte da função social. O novo texto substitui esse trecho e estabelece que basta o cumprimento do Código Florestal, incluindo regras sobre reserva legal e áreas de preservação permanente.
Em abril, o STF (Supremo Tribunal Federal) decidiu que o governo pode desapropriar imóveis rurais onde houver desmatamento ilegal ou incêndio doloso, desde que comprovada a responsabilidade do dono.
Para o autor da proposta, Rodolfo Nogueira, “defender a propriedade produtiva é defender a carteira registrada, a economia e o prato de comida na mesa do brasileiro”. O relator, Pedro Lupion, afirmou que o texto “estabelece parâmetros mais claros” e que “a reforma agrária séria não é inimiga do agronegócio, mas complementar a ele”.
No aspecto trabalhista, o projeto retira da lei a exigência de cumprimento das normas sobre arrendamento e parceria rural. A função social será considerada descumprida apenas em caso de condenação definitiva por crime contra as relações de trabalho.
Parlamentares de esquerda afirmam que a medida enfraquece a reforma agrária e pode favorecer propriedades onde há crimes ambientais ou trabalhistas.
O deputado Nilto Tatto (PT-SP), coordenador da Frente Parlamentar Ambientalista, disse que o texto atende a uma parcela muito pequena de grandes proprietários.
“Estamos falando de cerca de 2% que cometem crime, não atendem requisitos de produtividade, fazem negócios com narcotráfico, fazem trabalho escravo”, afirmou.
O texto também elimina o trecho que vinculava a função social ao fato de a exploração não gerar conflitos ou tensões sociais, previsto na lei atual.
Em 2023, o STF decidiu que o cumprimento da função social é condição para que um imóvel produtivo não possa ser desapropriado. A corte rejeitou ação da Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA) que buscava flexibilizar esse entendimento.