Apesar do embate entre apoiadores de Lula (PT) e de Jair Bolsonaro (PL) que dominou a política brasileira nos últimos anos, a maior parte da sociedade está fora da polarização acentuada e adota postura pragmática sobre os principais temas, aponta levantamento do think tank More in Common em parceria com a Quaest.
Os pesquisadores classificaram a sociedade brasileira em seis segmentos, de progressistas a conservadores. Um grupo situado em um dos extremos dessa divisão, enquadrado como “patriotas indignados” e correspondente a 6% da população, foi destacado como ponto de atenção pelo grau elevado de desconfiança das instituições no Brasil.
O estudo é resultado da análise de questionário com 168 perguntas aplicado a 10.002 pessoas de 16 anos ou mais, por meio de entrevistas domiciliares, de 22 de janeiro a 12 de fevereiro, com amostra representativa da população. A margem de erro é de 1 ponto percentual para os dados gerais, com nível de confiança de 95%.
O levantamento identificou visões políticas que dividem os brasileiros em três grandes grupos, cada um com dois segmentos. A maior parte da população (54%) ficou no grupo identificado na pesquisa como “invisíveis”, caracterizado por não ser nem de esquerda nem de direita.
Segundo Pablo Ortellado, diretor-executivo da More in Common Brasil, essa massa também não tem a convicção de centro. Ela é caracterizada por ser mais pragmática, não polarizada e mais independente, incluindo um segmento de “desengajados”, ligeiramente com posições mais à esquerda, e outro de “cautelosos”, um pouco mais à direita. Cada um corresponde a 27% da população.
Por isso, os pesquisadores entendem que os brasileiros estão menos divididos do que pode supor o senso comum. “O debate político parece dividir toda a população porque os segmentos minoritários são muito engajados e vocais, e os segmentos que não estão polarizados preferem se afastar da política”, afirma o estudo.
O resultado indica que a maior parte da sociedade forma uma “maioria invisível não polarizada” em assuntos ligados à agenda de costumes. Essa maioria é também menos escolarizada e menos engajada, mais pobre e mais negra.
Foram classificados como progressistas 19% da população, divididos em “militantes”, o grupo mais radical (com 5%), e “esquerda tradicional” (14%).
Os “militantes” são os mais escolarizados (53% com ensino superior), mais ricos (37% com renda familiar maior que R$ 10 mil) e mais sem religião (41%). Eles ficam isolados dos outros segmentos, inclusive da “esquerda tradicional”, em temas ligados aos direitos humanos.
Apenas cerca de 30% do grupo, por exemplo, concordam com a afirmação de que “menores de idade que cometem crimes devem ir para a cadeia”. Em todos os outros segmentos, ao menos 70% dos respondentes disseram concordar com a frase, e o valor para o total da amostra é de 85%.
Para essa pergunta específica, a margem de erro é 2 pontos percentuais para o total da amostra e de 8 pontos percentuais para os “militantes”.
Já os conservadores representam 27% da população, de acordo com a pesquisa. Além do segmento mais radical, de 6%, chamado na pesquisa de “patriotas indignados”, há os “tradicionais”, que representam 21%.
Entre os “patriotas indignados”, a maior parte não confia no Congresso Nacional (61%), na grande imprensa (62%), no Supremo Tribunal Federal (71%) e na Justiça Eleitoral (64%).
Dos “conservadores tradicionais”, a desconfiança nessas instituições é, respectivamente, de 46%, 48%, 52% e 45%.
Considerando toda a população brasileira, 41% não confiam no Congresso, 38% na grande imprensa, 37% no STF, e 35% no TSE.
A margem de erro relacionada às perguntas sobre desconfiança é de 4 pontos percentuais entre “patriotas indignados”, 2 pontos para os “conservadores tradicionais” e 1 ponto para o total da amostra.
Embora o grupo conservador mais radical seja apenas 6% dos brasileiros, Ortellado diz que o segmento de “conservadores tradicionais” tende a acompanhar os “patriotas indignados”, formando um conjunto de mais de um quarto da população com alta taxa de desconfiança.
De acordo com ele, a principal diferença entre os dois segmentos conservadores é que os patriotas são mais radicais, vão mais em protestos e compartilham mais conteúdo na internet. Ainda assim, ambos “apresentam certa continuidade de percepção e comportamento”.
Os “patriotas indignados” são mais escolarizados, com 24% deles com ensino superior, contra 16% dos conservadores tradicionais. Os dois têm a maior taxa de evangélicos por segmento, cada um com cerca de 40%.
Esse grupo mais extremo também é bastante mobilizado, com 49% considerando importante participar de manifestações políticas. Sobre partidos, 37% têm mais simpatia pelo PL, 70% se classificam como bolsonaristas, e a maioria se informa sobre política principalmente pelo WhatsApp (58%) e YouTube (59%).
Já os “conservadores tradicionais”, segundo grupo que mais desconfia, é pouco mobilizado, com apenas 27% deles conversando sobre política.