A clássica dúvida entre comprar e alugar um imóvel voltou às conversas familiares com a recente injeção de recursos no crédito imobiliário em um cenário ainda de juros altos. Se, por um lado, o governo federal lançou um novo modelo de financiamento para facilitar o acesso à casa própria, por outro, a prudência financeira e a segurança jurídica seguem essenciais para evitar prejuízos.
A planejadora financeira Nayra Sombra, da Planejar, resume a diferença entre as duas opções: “Comprar é decisão emocional e financeira; alugar é decisão estratégica”.
“Se a compra não comprometer a saúde financeira, faz sentido. Mas, se for para ‘se apertar’ e perder qualidade de vida, o aluguel é o melhor caminho”, afirma a especialista.
No dia 10 de outubro, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva lançou um novo modelo de crédito imobiliário para modernizar o SBPE (Sistema Brasileiro de Poupança e Empréstimo). A medida libera mais recursos para os bancos emprestarem crédito e facilita o acesso ao financiamento, especialmente para a classe média, ao mesmo tempo que cria expectativas de aquecimento no mercado imobiliário.
Antes, o governo Lula já havia ampliado o programa Minha Casa, Minha Vida para atender famílias com renda de até R$ 12 mil. O pacote habitacional também elevou em outubro o teto para a compra da casa própria com uso do FGTS (Fundo de Garantia do Tempo de Serviço), de R$ 1,5 milhão para R$ 2,25 milhões.
As mudanças podem estimular mais famílias a considerar a compra de um imóvel, mas exigem cautela. A regra geral é que a compra tende a fazer sentido para quem tem condições de assumir prestações ou quitar à vista sem comprometer reservas de emergência e pretende permanecer no imóvel por, pelo menos, 6 a 8 anos —tempo médio necessário para diluir custos de cartório, ITBI (imposto de transferência) e possíveis reforma. Já o aluguel é mais vantajoso para quem busca flexibilidade ou não quer se amarrar a financiamentos longos, especialmente em um cenário de crédito ainda caro.
O advogado Marcelo Tapai, especialista em direito imobiliário, alerta que o financiamento de longo prazo (15, 20 ou 30 anos) é sempre perigoso. A vida das pessoas muda, podendo haver perda de emprego, separação ou morte. Se o financiamento for assumido no limite da renda, o risco será o de perder o imóvel e tudo o que foi pago em caso de inadimplência.
Apesar da queda gradual da Selic (taxa básica de juros), o custo do crédito imobiliário segue elevado, com bancos cobrando taxas efetivas em dois dígitos ao ano, o que encarece os contratos de longo prazo e aumenta o valor total pago ao fim do financiamento.
Para quem financia 80% de um imóvel, por exemplo, as parcelas podem consumir boa parte da renda mensal, e o aluguel, que já foi visto como “dinheiro jogado fora”, pode ser uma estratégia para ter liquidez e planejar um futuro financiamento. Quem tem parte relevante do valor guardado pode se beneficiar de negociações diretas com construtoras ou proprietários.
A recomendação de Nayra é que todas as despesas com moradia (financiamento, condomínio, IPTU e contas de água e luz) não ultrapassem 30% da renda familiar líquida. Além disso, um dos erros mais comuns é usar toda a reserva na entrada, sendo essencial manter um “colchão de segurança” equivalente a, pelo menos, seis meses de despesas fixas.
Segundo ela, o aluguel é a melhor alternativa quando a pessoa valoriza mobilidade ou precisa de tempo para fortalecer a reserva financeira. Em um cenário de juros altos, manter o capital aplicado e alugar pode ser mais vantajoso, especialmente se o investidor tiver disciplina de longo prazo.
“O cenário ideal, o mundo perfeito, seria alugar um imóvel talvez um pouco menor, diferente daquilo que é o ideal para mim, e a diferença do valor do aluguel, eu investir, poupar, juntar para ter um volume razoável de dinheiro, para aí então eu dar entrada em um imóvel que eu queira comprar com uma entrada melhor, um número menor de parcelas, uma parcela com valor mais acessível”, diz Tapai.
QUANDO COMPRAR FAZ SENTIDO
- A compra só é recomendada quando o indivíduo possui estabilidade e disponibilidade financeira, como uma família que encontrou o imóvel ideal e pretende residir nele por muitos anos. É essencial manter uma reserva de emergência equivalente a pelo menos seis meses de despesas fixas
 - A compra costuma compensar se a permanência for de pelo menos 6 a 8 anos. Esse é o tempo médio necessário para diluir custos como ITBI, cartório e reformas. Se houver chance de mudança de cidade, casamento, ou separação nesse intervalo, é melhor esperar, pois vender o imóvel com pressa geralmente traz prejuízo
 
Regra de ouro: Todas as despesas de moradia (financiamento, condomínio, IPTU, contas) não devem ultrapassar 30% da renda familiar líquida
QUANDO ALUGAR É A MELHOR OPÇÃO
- O aluguel é a melhor alternativa quando a pessoa valoriza mobilidade ou precisa de tempo para fortalecer sua reserva financeira antes de assumir um compromisso longo
 - Manter o dinheiro aplicado e alugar pode ser mais vantajoso, especialmente se o investidor tiver disciplina de longo prazo e o cenário econômico estiver favorável. Com os juros atuais altos, a renda fixa pode cobrir boa parte ou o valor total do aluguel. Por exemplo, R$ 500 mil aplicados a 12% ao ano (líquidos) geram R$ 5.000 por mês
 - Se o financiamento for muito justo, ou se houver a necessidade de “se apertar” e perder qualidade de vida, o aluguel é o caminho mais seguro. Caso ocorra um aperto financeiro no aluguel, o locatário pode negociar uma redução temporária, mudar para um imóvel mais barato ou até encerrar o contrato, algo bem mais difícil quando se tem um financiamento de longo prazo.
 
CUIDADOS JURÍDICOS
NO MOMENTO DA COMPRA:
- A consultoria de um advogado especialista não deve ser vista como um gasto, mas sim como um investimento para evitar problemas futuros
 - O contrato padrão de papelaria é a “maior furada”. O contrato deve ser revisto e estabelecer absolutamente todas as cláusulas e detalhes que foram verbalmente combinados
 - A negociação deve ser fria, técnica, não baseada na confiança ou emoção
 - É crucial analisar com paciência e tranquilidade toda a documentação do imóvel e do proprietário, verificando se há dívidas, inclusive trabalhistas, que possam recair sobre o imóvel
 - O risco é comprar imóvel na planta é de pagar por anos e não ter a quem recorrer se a empresa falir. Além disso, o custo final é imprevisível, corrigido pelo INCC, que depende da inflação
 
NO MOMENTO DA LOCAÇÃO:
- O contrato de locação também deve ser detalhado e estabelecer índices de reajuste, quem paga IPTU e condomínio
 - É fundamental realizar uma vistoria detalhada no momento da entrada, com fotos e vídeos, para registrar o estado do imóvel
 - Um ponto importante a verificar é se quem está alugando o imóvel é, de fato, o proprietário, pois existem golpes em que a pessoa não é a dona e monta um contrato